Valdir
Brito de Oliveira Junior
As reflexões tratadas neste artigo são referentes às
experiências vividas acerca da intervenção[1] poética-urbana e coletiva “Morro
de Luz”, realizada no Parque Antônio Pires de Campos, popularmente conhecido
como “Morro da Luz”[2],
em Cuiabá, pelo Coletivo à Deriva[3], e o trabalho colaborativo
e em rede.
A ideia da intervenção “Morro de Luz” surgiu como
proposta da disciplina “Tópicos Especiais em Poéticas Contemporâneas I:
Conceitos, Diálogos e Horizontes” ministrada pela Prof.ª. Dra. Maria Thereza
Azevedo no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO)
da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
Apesar da proposta inicial ter sido originada de uma
disciplina de mestrado, o resultado final deve-se, também, pela colaboração de
convidados que não fazem parte do programa de pós-graduação aqui referido
anteriormente. O propósito era criar um roteiro em sala para divulgar, via web, para que outras pessoas pudessem
participar e contribuir à sua maneira. Ou seja, “a ideia de colaboração é
simples, nada mais que trabalhar conjuntamente em função de um objetivo”
(MOREIRA; JARDIM; ZIVIANI, 2010, p. 05). E o objetivo era ocupar um espaço que
deveria ser utilizado diariamente como parque e ponto turístico, mas por
descaso do poder público, estava esquecido e abandonado, mesmo estando no
centro da cidade.
Essa proposta de colaboração pode parecer fruto da
modernidade tecnológica, mas sua organização é percebida ao longo da história.
Moreira, Jardim e Ziviani (2010) afirmam que:
Embora os trabalhos
colaborativos e em rede envolvam uma infinidade de pessoas nos dias de hoje,
estas formas de organização social não são uma invenção contemporânea. Ao longo
da história, muitos povos se associaram de forma colaborativa com vistas a
vencerem dificuldades coletivas ou alcançarem algum objetivo comunitário
(mutirões para construção de casas ou para realização de festas coletivas, por
exemplo). No entanto, se antes estas idéias-forças eram colocadas em prática
pontualmente, hoje elas se apresentam como alternativas no mundo contemporâneo
para a ação coletiva no plano político, social e, o que mais nos interessa
aqui, na dimensão cultural. (MOREIRA; JARDIM; ZIVIANI, 2010, p. 04)
O (nosso) processo colaborativo começou em reuniões de
sala de aula, na interação entre discentes e docente, mas não demorou muito
para tomar os primeiros traços de como seria a intervenção. E assim que foi
delineada a trajetória e objetivos específicos (camisas pretas, horário e ponto
de encontro, uso de lanternas), a ideia saiu de sala (para web) e deu espaço para outros colaboradores. Dessa forma as ideias
saíram da turma de discentes da disciplina aqui já referida, ganhando novos
adeptos fora do ambiente físico-acadêmico, agora no ambiente virtual, onde
continuaram ocorrendo interações e sugestões. Entendemos então que “o processo
é construído a partir das interações entre os colaboradores e está em
permanente estado de evolução, sendo continuamente reprocessado e
auto-organizado” (MOREIRA; JARDIM; ZIVIANI, 2010, p. 05).
Nesse novo ambiente virtual a interação pela web acontecia na famosa rede social Facebook, onde um evento[4] foi criado para divulgação, e em um blog[5], onde também eram
compartilhadas informações a respeito do evento e informações sobre o Morro da
Luz. No Facebook ouve mais interação, e o evento chegou a marca de 4,4 mil
(quatro mil e quatrocentos) usuários convidados. Esse alcance em divulgação de
uma mensagem se dá pela possibilidade de interatividade entre os usuários. Essa
interatividade na rede se dá “precisamente da convergência entre o social e o
tecnológico” (LEMOS, 1997, p. 8).
Lévy (1999) já afirmava essa interatividade na
comunicação através mundo virtual bem antes do Facebook existir:
A comunicação por
mundos virtuais é, portanto, em certo sentido, mais interativa que a
comunicação telefônica, uma vez que implica, na mensagem, tanto a imagem da
pessoa como a da situação, que são quase sempre aquilo que está em jogo na
comunicação (LÉVY, 1999, p. 81)
Com toda a interatividade possível dentro dessa rede
social, a intervenção se torna mais fácil de ganhar novos adeptos ao movimento
efêmero e novos conceitos também. Arantes (2010) afirma que “o crescente uso de
formas operacionais de comunidades da rede (...) são importantes estratégias de
democratização, de compartilhamento, de acesso e de troca de informações” (ARANTES,
2010, p. 04).
A intervenção como tentativa de resgate de um local
esquecido – e até temido pela falta de iluminação e segurança – não se prende
apenas ao efêmero ato poético-urbano, como seu ativismo perpetua. Mesmo se não
quiser ser ativista, ela o é. Esse ativismo é debatido, mesmo que sutilmente, na
rede e se reflete na rua, na performance, seja em forma de poesia, de música,
ou no simples ato de ocupar algo que já não era ocupado. É importante “perceber
que, para além de serem vistos como meras ferramentas de troca de informações,
estas novas formas operacionais e em rede vêm sendo vistas, também, como
instrumentos importantes de mídia ativismo”. (ARANTES, 2010, p. 03).
Esse movimento então é originado em um grupo menor de
pessoas, em um espaço limitado, e se desprende da arquitetura física e se
permite na rede. Essa inserção no virtual permite colaborações de pessoas que
não estavam presentes desde o início, reformulando e acrescentando ideias.
Essas ideias ganham corpos e esses corpos ocupam o espaço, “Morro da Luz”. O “Morro
de Luz” é um trabalho colaborativo – e em rede – que ganha forças ativistas na
sua sutil maneira de ocupar e interagir.
REFERÊNCIAS
ARANTES, Priscilla. Impacto dos Weblogs: Geopolítica,
Compartilhamento e Filosofia Open Source. In: NP 08 – Tecnologias da
Informação e da Comunicação do V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.
2005.
CALDEIRA, Solange
Pimentel. O lamento da Imperatriz:
A Linguagem em Trânsito e o Espaço Urbano em Pina Bausch. São
Paulo: Annablume, 2009.
Intervenção
Urbana. Disponível em: <http://www.intervencaourbana.org/>.
Acesso em: 20 Jun. 2014.
LEMOS, André. Ciber-Socialidade: Tecnologia e Vida Social
na Cultura Contemporânea. Disponível em: < http://www.facom.ufba.br/pesq/cyber/lemos/cibersoc.html>.
Acesso em: 20 Jun. 2014.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. Trad. Carlos Irineu da Costa. São Paulo, Ed. 34, 1999.
MOREIRA, Fayga; JARDIM,
Gustavo; ZIVIANI, Paula. Trabalho
Colaborativo e em Rede com a Cultura. Gestão Cultural: Competência e Desafios.
No Prelo.
[1] De acordo com o dicionário online
Priberam < http://www.priberam.pt/>: ator de intervir = tomar parte em;
participar; interferir; interceder. No caso de intervenções urbanas o termo utilizado para designar as intervenções realizadas em
espaços públicos.
[2]
Para conhecer mais sobre o Morro da Luz: < http://www.cuiaba.mt.gov.br/upload/arquivo/morro_da_luz.pdf>
[3]
O Coletivo à
Deriva surgiu em 2009, e está ligado ao Grupo de Pesquisas "Artes
Híbridas: intersecções, contaminações e transversalidades”. Desde o seu
surgimento atua em intervenções e performances poética-urbanas na capital
cuiabana. Para conhecer mais: Facebook Oficial: < https://www.facebook.com/pages/Coletivo-%C3%A0-Deriva/255646701141126>;
Blog: < http://coletivoaderivacuiaba.blogspot.com.br/>.